quarta-feira, 4 de abril de 2018

Jurisprudência: competência da Justiça Federal - PARTE 1



Competência criminal da Justiça Federal
- crime ambiental decorrente de programa habitacional popular “minha casa minha vida”: (a) Caixa Econômica Federal como mera entidade financiadora – competência da justiça ESTADUAL; (b) CEF como agente executor de políticas públicas responsável pela execução da obra – competência da justiça FEDERAL

“Em análise à jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça - STJ constata-se haver diferenciação de responsabilidade da CEF conforme sua atuação como agente meramente financeiro ou como agente executor de políticas públicas responsável pela execução da obra. Todavia, verifica-se que o fato de o imóvel não estar edificado não implica, por si só, a responsabilização da CEF por dados causados pela obra, sendo imprescindível a análise contratual e riscos por ela assumidos. Precedentes. Para a responsabilização da CEF por dano ambiental causado pela obra é imprescindível sua atuação na elaboração do projeto,  mormente em se tratando de direito penal que inadmite a responsabilidade objetiva. O contrato entre a CEF e a construtora evidencia que o acompanhamento da obra foi restrito à verificação de conclusão de etapas para a liberação do financiamento, sem responder, contudo, pela higidez da obra, que ficou a cargo apenas da construtora.
Na espécie, verifica-se que a fiscalização da CEF limitou-se ao cumprimento do cronograma da obra para fins exclusivamente financeiros.”
(CC 139.197/RS, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 25/10/2017, DJe 09/11/2017)

- crimes praticados por Procurador da República: Tribunal Regional Federal em com alcance sobre sua atuação; se eleitoral: Tribunal Regional Eleitoral

“Nos termos do art. 108, I, da Constituição, compete aos Tribunais Regionais Federais processar e julgar, originariamente, os membros do Ministério Público da União, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral. [...] Ocorre que, diversamente dos juízes federais, os procuradores da república não estão vinculados necessariamente a um dos Tribunais Regionais Federais. Na época dos fatos, o requerente Ângelo Goulart Villela atuava como Procurador da República exclusivamente no âmbito do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. [...] Assim, aquele tribunal regional é o competente para julgá-lo em razão da competência ratione loci, que deve ser conjugada com a competência por prerrogativa de foro.
(Pet 7063, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Relator(a) p/ Acórdão: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 01/08/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-021 DIVULG 05-02-2018 PUBLIC 06-02-2018)

- pedofilia na internet: (a) acesso restrito (email; whatsapp; chat do facebook) – Justiça Estadual; (b) acesso livre (postagem em rede social) – Justiça FEDERAL.
Será da justiça federal porque a pedofilia é objeto de repressão de tratado internacional do qual o Brasil é signatário e também em razão da caracterização da internacionalidade da conduta, eis que praticado por meio de acesso livre e irrestrito na rede mundial de computadores, podendo ser visualizado em qualquer parte do mundo (art. 109, V, CF).

“A Justiça Federal é competente, conforme disposição do inciso V do art. 109 da Constituição da República, quando se tratar de infrações previstas em tratados ou convenções internacionais, como é caso do racismo, previsto na Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial, da qual o Brasil é signatário, assim como nos crimes de guarda de moeda falsa, de tráfico internacional de entorpecentes, de tráfico de mulheres, de envio ilegal e tráfico de menores, de tortura, de pornografia infantil e pedofilia e corrupção ativa e tráfico de influência nas transações comerciais internacionais.
[...] o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 628.624/MG, em sede de repercussão geral, assentou que a fixação da competência da Justiça Federal para o julgamento do delito do art. 241-A do Estatuto da Criança e do Adolescente (divulgação e publicação de conteúdo pedófilo-pornográfico) pressupõe a possibilidade de identificação do atributo da internacionalidade do resultado obtido ou que se pretendia obter. Por sua vez, a constatação da internacionalidade do delito demandaria apenas que a publicação do material pornográfico tivesse sido feita em "ambiência virtual de sítios de amplo e fácil acesso a qualquer sujeito, em qualquer parte do planeta, que esteja conectado à internet" e que "o material pornográfico envolvendo crianças ou adolescentes tenha estado acessível por alguém no estrangeiro, ainda que não haja evidências de que esse acesso realmente ocorreu."
[...] Tanto no aplicativo WhatsApp quanto nos diálogos (chat) estabelecido na rede social Facebook, a comunicação se dá entre destinatários escolhidos pelo emissor da mensagem. Trata-se de troca de informação privada que não está acessível a qualquer pessoa.”
(CC 150.564/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 26/04/2017, DJe 02/05/2017)

- crime transnacional envolvendo animais exóticos: competência da justiça FEDERAL, estando combinados os requisitos da existência de tratado internacional do qual o Brasil é signatário e da internacionalidade da conduta.

[...]
4. A competência da Justiça Federal aplica-se aos crimes ambientais que também se enquadrem nas hipóteses previstas na Constituição, a saber: (a) a conduta atentar contra bens, serviços ou interesses diretos e específicos da União ou de suas entidades autárquicas; (b) os delitos, previstos tanto no direito interno quanto em tratado ou convenção internacional, tiverem iniciada a execução no país, mas o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro - ou na hipótese inversa; (c) tiverem sido cometidos a bordo de navios ou aeronaves; (d) houver grave violação de direitos humanos; ou ainda (e) guardarem conexão ou continência com outro crime de competência federal; ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral, conforme previsão expressa da Constituição.
[...]
7. (a) Os compromissos assumidos pelo Estado Brasileiro, perante a comunidade internacional, de proteção da fauna silvestre, de animais em extinção, de espécimes raras e da biodiversidade, revelaram a existência de interesse direto da União no caso de condutas que, a par de produzirem violação a estes bens jurídicos, ostentam a característica da transnacionalidade. (b) Deveras, o Estado Brasileiro é signatário de Convenções e acordos internacionais como a Convenção para a Proteção da Flora, da Fauna e das Belezas Cênicas Naturais dos Países da América (ratificada pelo Decreto Legislativo nº 3, de 1948, em vigor no Brasil desde 26 de novembro de 1965, promulgado pelo Decreto nº 58.054, de 23 de março de 1966); a Convenção de Washington sobre o Comércio Internacional das Espécies da Flora e da Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (CITES ratificada pelo Decreto-Lei nº 54/75 e promulgado pelo Decreto nº 76.623, de novembro de 1975) e a Convenção sobre Diversidade Biológica CDB (ratificada pelo Brasil por meio do Decreto Legislativo nº 2, de 8 de fevereiro de 1994), o que destaca o seu inequívoco interesse na proteção e conservação da biodiversidade e recursos biológicos nacionais. (c) A República Federativa do Brasil, ao firmar a Convenção para a Proteção da Flora, da Fauna e das Belezas Cênicas Naturais dos Países da América, em vigor no Brasil desde 1965, assumiu, dentre outros compromissos, o de “tomar as medidas necessárias para a superintendência e regulamentação das importações, exportações e trânsito de espécies protegidas de flora e fauna, e de seus produtos, pelos seguintes meios: a) concessão de certificados que autorizem a exportação ou trânsito de espécies protegidas de flora e fauna ou de seus produtos”. (d) Outrossim, o Estado Brasileiro ratificou sua adesão ao Princípio da Precaução, ao assinar a Declaração do Rio, durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (RIO 92) e a Carta da Terra, no “Fórum Rio+5”; com fulcro neste princípio fundamental de direito internacional ambiental, os povos devem estabelecer mecanismos de combate preventivos às ações que ameaçam a utilização sustentável dos ecossistemas, biodiversidade e florestas, fenômeno jurídico que, a toda evidência, implica interesse direto da União quando a conduta revele repercussão no plano internacional.
8. A ratio essendi das normas consagradas no direito interno e no direito convencional conduz à conclusão de que a transnacionalidade do crime ambiental, voltado à exportação de animais silvestres, atinge interesse direto, específico e imediato da União, voltado à garantia da segurança ambiental no plano internacional, em atuação conjunta com a Comunidade das Nações.
9. (a) Atrai a competência da Justiça Federal a natureza transnacional do delito ambiental de exportação de animais silvestres, nos termos do art. 109, IV, da CF/88; (b) In casu, cuida-se de envio clandestino de animais silvestres ao exterior, a implicar interesse direto da União no controle de entrada e saída de animais do território nacional, bem como na observância dos compromissos do Estado brasileiro perante a Comunidade Internacional, para a garantia conjunta de concretização do que estabelecido nos acordos internacionais de proteção do direito fundamental à segurança ambiental.
10. Recurso extraordinário a que se dá provimento, com a fixação da seguinte tese: “Compete à Justiça Federal processar e julgar o crime ambiental de caráter transnacional que envolva animais silvestres, ameaçados de extinção e espécimes exóticas ou protegidas por Tratados e Convenções internacionais”.
(RE 835558, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 09/02/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-174 DIVULG 07-08-2017 PUBLIC 08-08-2017)

- crime de estelionato praticado mediante falso Tribunal Internacional de Justiça e Conciliação: competência da Justiça ESTADUAl, pois não afeta diretamente interesse da União.

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL X JUSTIÇA ESTADUAL. INQUÉRITO POLICIAL. FALSO TRIBUNAL INTERNACIONAL DE JUSTIÇA E CONCILIAÇÃO MONTADO EM CAMPINAS/SP, COM O INTUITO DE LUDIBRIAR VÍTIMAS PARTICULARES, COBRANDO-LHES VALORES INDEVIDOS PARA A SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS. ESTELIONATO. INEXISTÊNCIA DE REGISTRO JUNTO AO CONSELHO NACIONAL DAS INSTITUIÇÕES DE MEDIAÇÃO E ARBITRAGEM - CONIMA QUE NÃO AFETA INTERESSE DA UNIÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL.
1. Situação em que falso juiz, que se auto intitulava nomeado como representante da ONU, e outros comparsas montaram elaborado esquema, utilizando certificados, distintivos, bonés da Polícia Civil, adesivos da Polícia Militar, "processos" e até uma tabela de custas para dar aparência de legalidade a tribunal de arbitragem, e, com isso, ludibriar vítimas particulares das quais eram cobradas custas e honorários ilegais, para a solução de controvérsias. Na situação específica dos autos, duas vítimas particulares foram induzidas a pagar R$ 2.000,00 para a solução de conflito decorrente de acidente de trânsito. Não se questiona, até o momento, possível usurpação de função pública (art. 328 do CP).
2. A obtenção de vantagem ilícita em prejuízo de vítimas particulares que foram mantidas em erro mediante a simulação de uma instituição jurídica (um falso tribunal), assim como da qualidade de magistrado de um dos envolvidos na fraude constitui conduta que se adequa, em princípio, ao tipo do estelionato (art. 171, CP).
3. A ausência de registro do falso tribunal perante o Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem - CONIMA, cuja natureza jurídica é de sociedade civil, sem fins lucrativos, por si só, não tem o condão de revelar interesse da União, de suas autarquias ou de empresas públicas federais na persecução criminal dos investigados. Isso porque se trata, nitidamente, de instituição privada que congrega, como associados, outras instituições privadas, e que não possui, dentre os objetivos elencados em seu estatuto, a fiscalização de instituições de arbitragem, nem tampouco a obrigatoriedade de filiação ao Conselho para revestir de legalidade a instituição de mediação e arbitragem.
4. Embora as normas não se apliquem ao caso concreto, cujos eventos ocorreram em 2014, vale lembrar que o novo CPC (Lei 13.105, de 16/03/2015) dispôs sobre os conciliadores e mediadores judiciais nos arts. 165 a 175, salientando a necessidade de sua inscrição em cadastro nacional (mantido pelo CNJ) e em cadastro de tribunal de justiça ou de tribunal regional federal. Da nova legislação, é possível depreender a existência de cadastros específicos de mediadores e conciliadores junto à Justiça Estadual ou Federal, de acordo com as controvérsias específicas levadas à conciliação. E, como no caso dos autos a controvérsia girava em torno de acidente de trânsito, mais uma vez a solução do conflito aponta para a competência da Justiça Estadual.
5. A possibilidade de descoberta de outras provas e/ou evidências, no decorrer das investigações, levando a conclusões diferentes, demonstra não ser possível firmar peremptoriamente a competência definitiva para julgamento do presente inquérito policial. Isso não obstante, tendo em conta que a definição do Juízo competente em tais hipóteses se dá em razão dos indícios coletados até então, revela-se a competência da Justiça Estadual para condução do inquérito policial.
6. Conflito conhecido, para declarar competente para a condução do inquérito policial o Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal de Campinas/SP, o suscitado.
(CC 146.726/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 14/12/2016, DJe 01/02/2017)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.